domingo, fevereiro 24, 2008

Fernando Pessoa e João Vilaret

É habito no NVV Veronique quando navega em flotilha, ao VHF, dizer-se o Mostrengo.
Umas vezes digo-eu, outras vezes há que convido alguns Amigos para o dizerem:


O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
A roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar, E disse:
«Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»

«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.

«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:

«El-Rei D. João Segundo!»
Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:

«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,

Manda a vontade, que me ate ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»

1 comentário:

Laurus nobilis disse...

O Pessoa esteve muito bem quando o escreveu! Faz-me sempre lembrar Cruzes de Cristo a sulcar os mares!